Wandinha: 4 erros de roteiro para evitar construção da sua narrativa

Divulgação/Netflix

Lançada 23 de novembro, quarta-feira — irônico, não? — pela Netflix, não tardou para que a série Wandinha batesse o recorde de estreia, com 341,2 milhões de horas assistidas apenas na primeira semana após sua estreia (CNN).

A série, dirigida e produzida por Tim Burton e com nomes de peso no elenco, como Jenna Ortega, Catherine Zeta Jones e Gwendoline Christie, traz de volta uma das famílias mais queridas da cultura POP: a Família Addams.

O que você vai ler neste artigo:
  • Família Addams: a origem
  • Wandinha: sinopse
  • Wandinha: críticas da série
  • 4 erros para evitar na sua narrativa
Família Addams: a origem

Criada por Charles Addams, a primeira aparição dessa família foi em 1937, no jornal The New Yorker, em forma de HQ. Em sua origem, os personagens sombrios não tinham nome, tampouco vínculo familiar (Legião dos heróis).

Em uma parceira com o autor de Fahrenheit, Ray Bradbury, Charles elaborou os arcos dos personagens como a família rica e peculiar que conhecemos hoje. E, a partir daí, suas aparições tornaram-se cada vez mais frequentes em diferentes produções audiovisuais: filmes, séries, desenhos, etc.

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Wandinha: sinopse

Ao retomar a história de personagens tão queridos, Burton traz uma novidade: a sádica filha mais velha do casal tão aclamado é, agora, uma adolescente.

Após quase matar um colega para vingar o irmão caçula, Wandinha é transferida para Nunca Mais, uma escola para seres que, assim como ela, pertencem a famílias e classes excluídas (lobisomens, sereias, gárgolas, etc.)

Rapidamente, ela se vê envolvida em um mistério que ronda a escola e a cidade fronteiriça Jericho e tem a ver com seu passado. Movida pela curiosidade, passa a fazer de tudo para desvendá-lo. Junto com a protagonista, emergimos nos novos cenários, relações, impasses e aventuras vivenciados por ela.

Wandinha: críticas da série

É inegável que a série acertou em vários pontos: cenário, fotografia, atuação e figurino, por exemplo. Mas quando o assunto é enredo, ela não escapou das críticas, feitas por diferentes portais e especialistas. E o motivo é o mesmo de outras produções da Netflix: o roteiro.

O que acontece é que a produtora, assim como todas as outras, tende a seguir uma fórmula predefinida conforme cada material para cada público. Por isso, abusa de lugares comuns e arquétipos que já deram certo em outros materiais audiovisuais.

Em alguns casos e para determinados espectadores, funciona. Mas em outros, não.

E um erro bastante cometido por escritores iniciantes — e nem tão iniciantes assim — é repetir as referências dos materiais que mais consome.

Em outras palavras, se um autor só assiste a filmes de terror e decide escrever sobre esse gênero, a chance de usar recursos narrativos que aparecem com mais frequência é grande.

E isso é um problema? Depende. Até certo ponto esse processo é natural e até essencial para a criação literária. Afinal, um dos primeiros passos para começar a escrever é estudar e buscar referências acerca do tema e gênero escolhidos.

Entretanto, é necessário cuidado para não copiar tudo o que já foi feito, deixando a narrativa pobre de originalidade.

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Aproveitando algumas das falhas que pude observar junto às críticas que li, decidi escrever esse texto para você se nortear sobre o que não fazer ao começar um novo livro, usando como exemplo nossa gótica preferida do momento.

Mas atenção: esse conteúdo contém spoilers. Se você ainda não viu a série e não gosta de spoilers, sugiro salvar este artigo para ler depois.

4 erros para evitar na sua narrativa

1. Arcos clichês
Divulgação/Netflix

A melhor amiga que contrasta com a personalidade da protagonista, o triângulo amoroso, a popular da escola e seu grupinho de meninas malvadas: tudo isso já vimos várias e várias vezes em inúmeras produções adolescentes.

É claro que não é um problema recorrer a esses elementos; afinal, eles fazem sucesso e se usados corretamente podem temperar sua narrativa, deixando-a suculenta para o leitor. Mas é necessário tomar cuidado para não inserir de qualquer jeito e forçar uma barra.

O triângulo amoroso, por exemplo, soa forçado. Os vínculos nascem rápido demais e sem um grande contexto ou justificativa para isso. A não ser, claro forçar o espectador a aceitar o charme do misterioso Xavier ou o carisma do amigável Tyler (e essas personalidades são, por si só, clichês dentro de um triângulo) e fazê-lo torcer por algum dos dois.

Ah, e Xavier precisava mesmo ser o ex-namorado de Bianca, rival da protagonista? Não poderia ser menos previsível, produção?

Fora esses exemplos, é possível notar vários outros lugares comuns que empobrecem a narrativa, como um baile sem mais nem menos — e a sabotagem à la Carrie, a estranha.

2. Personagens estereotipados
Divulgação/Netflix

Sabe o que a melhor amiga histérica, o cotado par romântico misterioso, a rival maldosa, o nerd que tem asma, os valentões que fazem bullying com os excluídos e a diretora carrasca têm em comum: todos são caricaturas.

Esses personagens soam tanto como uma versão exagerada de si mesmos que acabam por afastar o espectador da identificação. Eles não parecem pessoas de verdade, uma vez que não apresentam nuances significativas: Enid é sempre expansiva — ai, ela é tão galera! e Xavier é melancólico e com o mesmo carão em todos os seus minutos de série, por exemplo.

Ah, para, né? Apesar de termos personalidades e padrões de comportamentos que se repetem, ninguém é a mesma coisa o tempo todo.

Quando for criar um personagem, garanta que ele tenha nuances, camadas e variações de comportamento. Você pode até usar o estereótipo ao seu favor, mas não faça dele uma muleta.

3. Falar mais do que mostrar
Divulgação/Netflix

No Instagram do EC, nas minhas mentorias e no curso de escrita criativa do Concurso Escrita em Ação, já mencionei essa técnica de escrita. Enquanto a técnica consistem em falar menos e mostrar mais, a série faz o contrário: fala mais e mostra menos. Quer alguns exemplos?

Após Wandinha ser salva por Xavier, ele revela que ambos já se conheciam de tempos passados, e que ela salvou sua vida; por isso, estavam quites. Ele conta, mas não visualizamos nenhuma cena que de fato mostre que aconteceu.

E, suspeito eu, que seja a falta dessa cena, a ausência da visualização do vínculo entre um Xavier e uma Wandinha crianças, que faz com que o laço dos dois soe tão artificial.

Além disso, em vários momentos Wandinha menciona como sua família é sádica e mórbida e como ela mesma é assim: ela nos conta de novo, de novo e mais uma vez.

Mas nós quase não vemos essa faceta nas cenas que se desenrolam. Exceto pelo início icônico — a cena das piranhas —, todas as outras não alcançam a mesma potência.

E isso nos afasta, mais uma vez, da narrativa que está sendo contada.

Na escrita, a técnica é bem aplicada quando usamos palavras não para dizer que “fulano é sádico”, mas a partir da descrição de suas atitudes, mostrar que ele é assim.

4. Falhas de continuidade
Divulgação/Netflix

Para tudo: é sério que de um episódio para o outro Wandinha e Bianca se tornam parceiras do crime? De onde Wandinha conhece as pessoas que fizeram a surpresa de aniversário e qual é seu vínculo com essas pessoas?

Não vou nem falar da terapia, que abre um gancho para o desenvolvimento da protagonista e não leva a lugar nenhum.

Fora esses, o roteiro é marcado por vários outros buracos que prejudicam o desenrolar dos fatos e acabam por diminuir a potência da série.

Esse é um erro muito comum cometido por escritores. Para evitá-lo, é necessário criar os personagens considerando seu arco de desenvolvimento e quais acontecimentos acontecerão com ele para que cumpra com sua necessidade dramática.

Por isso, não se deve começar um novo projeto sem antes planejá-lo. O planejamento evita o desenvolvimento de cenas e situações que acabam em lugar nenhum, ciclos que não se fecham, cenas mal elaboradas e até o temível bloqueio criativo.

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Por fim, eu te garanto: se seguir essas dicas e tomar cuidado para não cometer esses erros, sua narrativa vai fluir bem e seus leitores vão te agradecer.

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Publicado por Ana Itagiba

Escritora, editora, revisora textual formada em letras pela UFG. Produtora de conteúdo para redes sociais e web. Autora dos livros Patético Oásis, O Experimento. Idealizadora do Concurso Escrita em Ação.

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